Na
postagem passada eu falei da palavra como guia para a selva escura, ou seja,
como um instrumento para lançar luz sobre ideias e pensamentos que permanecem
no escuro, na confusão e na indeterminação da mente, quando a palavra não é
usada para iluminá-los. Seguindo a mesma linha, quero falar agora sobre a
palavra como organizadora da alma. Alguns podem não se sentir muito à vontade
com esse termo “alma”, porque vários obstáculos, várias dúvidas, foram postos
no pensamento das pessoas pela cultura materialista moderna. Caso haja essa
dificuldade, bastará encarar o termo “alma” como “mente” ou “inteligência”.
O
que seria organizar a alma através da palavra? Seria dar distinção a cada ideia,
desfazendo confusões, misturas, sobreposições, dando nitidez a cada pensamento,
bom delineamento, de modo a torná-lo mais visualizável e manuseável, de modo a
poder ser dito e compartilhado com outros. Distinguir as ideias, clarificá-las,
colocar as semelhantes próximas umas às outras, percebendo ligações
importantes. Isso é organizar a alma.
Ideias
sobrepostas, misturadas, mal delineadas geram confusão, desorientação e
desconforto. A palavra vem como um instrumento para ordená-las,
classificando-as e distinguindo-as.
Pessoas
que têm uma quantidade muito exígua de ideias em sua mente podem não sentir
esse desconforto de que estou falando, porque não se esforçaram para absorver ideias
novas, pensamentos diversos de fontes heterogêneas, como as provenientes de
outras culturas. Essas pessoas ficam circulando naquele estreito circuito
conhecido, já tantas vezes trilhado, absorvendo, uma vez ou outra, alguma
pequena ideia nova que não causa muito impacto no conjunto.
Por
outro lado, aqueles que estão se dedicando intensamente aos estudos, procurando
conhecimento em todas as fontes, ainda nas mais distantes, dia após dia,
contínua, incansável e afanosamente, terão de enfrentar o desconforto de muitas
ideias misturadas e sobrepostas e precisarão de maneira ininterrupta de usar a
palavra como meio de organizar os seus pensamentos, classificando-os e
ordenando-os.
Quem,
por exemplo, decide ir além das fronteiras ocidentais da cultura e absorver as
estruturas de pensamento orientais ou de outros grupos estranhos a nós, como os
do extremo norte da Europa, com suas músicas e baladas medievais, certamente
sentirá o impacto das grandes diferenças e visões de mundo, absorvendo símbolos
novos que, por serem vistos por alguém alheio ao sistema cultural completo,
poderão ser erroneamente interpretados ou pelo menos mal compreendidos pela
imprecisão da visão. Isso gerará a confusão de que falei acima e exigirá o
esforço ordenador, clarificador e classificador feito através da palavra. Por
isso, escrever sempre num caderno ou expor oralmente a outros as novas ideias absorvidas
é muito proveitoso para o estudante.
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